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terça-feira, 14 de fevereiro de 2012

“O carnaval ainda existe porque a gente resiste”

O papel do Estado em relação ao carnaval popular, a necessidade de modernização do Conselho Municipal do Carnaval e o processo oportunista de africanização dos artistas da “axé music” para conseguir espaço na mídia até a Copa de 2014. Estes são alguns dos assuntos tratados nesta “roda de entrevista” formada pelo secretário estadual da Negritude Socialista – Bahia e vice-presidente do bloco Alabê, Ari Sena; o cantor e compositor Tonho Matéria, do Bloco da Capoeira; Nadinho, do Afoxé Filhos do Congo e presidente da Associação Nacional de Afoxés; o cantor, compositor e ator Gerônimo Santana e seu parceiro Enoque.
Esse encontro de “bambas” que a assessoria do PSB-Bahia teve a honra de presenciar numa tarde de terça-feira – dia de bênção no Pelourinho -, aconteceu na Casa de Gerônimo, poucas horas antes do anfitrião começar o show gratuito que faz há oito anos na escadaria da Igreja do Passo sem nenhum apoio dos empresários do turismo da região, que incluem a apresentação nos seus roteiros.
Antes que você pergunte o que um partido político fazia nessa reunião de artistas, militantes da cultura afro-brasileira e do carnaval popular de Salvador, saiba que todos eles, com exceção de Enoque, são filiados ao PSB. Entenda agora o porquê.

PSB-Bahia: Qual a importância do carnaval popular que vocês defendem?
Tonho Matéria: O carnaval ainda existe porque a gente resiste.
Gerônimo Santana: Ele surgiu da espontaneidade das pessoas. Eu lembro que aqui mesmo no Pelourinho, quando chegava o carnaval, os moradores compravam duas caçambas de areia para jogar no Beco do Mota, onde tem a Ladeira do Ferrão, para poder se dissipar pela rua. Todo mundo fazia isso e o Pelourinho participava dessa festa. Com a organização dos blocos, imagine você que os blocos afro e afoxés só podiam desfilar na Baixa do Sapateiro e não podiam passar do Terreiro de Jesus, porque se chegassem na Rua Chile iam encontrar o “carnaval de branco”. Bloco de preto não podia adentrar a Avenida. O carnaval dos pretos era aqui.
PSB-Bahia: Era um apartheid.
Gerônimo Santana: Era. E isso só foi mudar na década de 1950, com o trio-elétrico de Dodô e Osmar e o afoxé, que saiu no meio da galera. Mas houve perseguição, houve de tudo, até morte. E naquela época, a Igreja Católica tinha uma reação muito forte de intolerância religiosa. Não era brincadeira, não. Os mais antigos podem contar até mais do que eu. Essa herança toda de resistência popular nós carregamos. Somos profissionais do entretenimento, mas que o povo tem que brincar, tem. Quando tem a participação popular, nossa apresentação se torna mais rica. Claro que não posso tapar o sol com a peneira. Não vou dizer que o projeto dos caras que estão aí é ruim, porque não é. É tão bom que eles se negam a fazer uma divisão. É primeiro eu, segundo eu, terceiro eu, quarto eu e o resto, nós. Agora, os patrocinadores do Estado e do Município deveriam ter um olhar para as instituições que fazem o carnaval para o povo. Quem mais consome cerveja é quem está fora da corda. Acho também que deveria haver a Secretaria do Carnaval, porque ele é tão importante para a nossa economia, para contratação de mão de obra, que deveria ter uma verba garantida no orçamento.
PSB-Bahia: O Conselho Municipal do Carnaval não cumpre essa função de planejamento da festa?
Gerônimo Santana: Necessita melhorar. Tem de ter outras vozes lá dentro, com direito à voz e voto.
Ari Sena: O Conselho do Carnaval deveria ser o ambiente para se discutir e organizar o carnaval na cidade de Salvador e foi criado com esse objetivo. Mas possui uma série de amarrações quanto a alterações na sua composição, porque ele só pode ser modificado com a aprovação de dois terços da Câmara de Vereadores. Por outro lado, quando o conselho foi criado havia assento, por exemplo, para cronistas carnavalescos e clubes sociais, dentro de um processo de segmentação do carnaval. E o que é pior: pelo poder público, a Polícia Civil vota, a Polícia Militar vota, o Juizado de Menores vota, o representante da Câmara de Vereadores vota, enfim, dos 24 representantes do conselho, 15 ou 16 são de órgãos públicos. Então, os gestores públicos fazem do conselho aquilo que acham que devem, passam o rolo compressor, aprovam tudo. Sem falar do segmento empresarial, que se faz presente com os donos de bloco, a Abav e outras entidades. Mas o carnaval é uma coisa muito dinâmica. É preciso reestruturar urgentemente o conselho, democratizar sua estrutura, para que ele possa, de fato, trazer a sociedade para ajudar os gestores no processo de tomada de decisões. Temos o segmento de bloco de índios, por exemplo – que já teve Apaches, Comanches, Cacique, Tupis, Viu Não Vá, Tamoios e outros – e que eu não quero que acabe nunca, mas que deveria estar numa condição especial porque só restam os Apaches e os Comanches.
PSB-Bahia: Blocos afro, afoxés e artistas independentes não têm assento lá?
Nadinho do Congo: Os blocos afro e afoxés acabam sendo utilizados como uma base de composição. Na hora do vamos ver, de buscar aporte financeiro, os blocos afro e afoxés ficam de fora. Exceto alguns, que se contam nos dedos.
PSB-Bahia: O Ilê Aiyê, por exemplo, acaba de fechar um contrato com a Petrobras.
Nadinho do Congo: Mas o Ilê Aiyê participa do Fórum de Entidades Negras (formado também pelo Okambi, Cortejo Afro, Muzenza, Olodum, Malê de Balê e Os Negões), que não tem participação no Conselho do Carnaval. É importante que o Ilê e outros blocos do Fórum tenham fechado com a Petrobras, mas a gente acha que ainda é preciso se apoiar outras entidades que não participam do Fórum e que têm compromisso social com o carnaval. Tem o aporte que o governo do Estado faz por meio do Carnaval do Ouro Negro, que é importante, mas é preciso uma outra visão, um outro formato porque acaba beneficiando projetos de muitas instituições que estão no Fórum e recebem esse apoio da Petrobras.
Enoque: A lógica do Estado diante das entidades negras no Carnaval é a seguinte: em um momento eles tentam criar normas para poder organizar e, em outros, deixam que o mercado opere pela livre iniciativa. Ou seja, vá a campo, vá à luta e, a partir do seu tamanho e posição nos circuitos do carnaval, você recebe recursos ou não. E para finalizar, gostaria de dizer o seguinte, os recursos governamentais para as entidades de, vamos dizer, “pequeno porte” é insignificante. Praticamente não há ajuda nenhuma e, às vezes, até atrapalha.
Ari Sena: As estruturas de Estado têm que desempenhar um papel para garantir o carnaval cultural e isso não é feito. Falo com muita tranquilidade porque fui um dos articuladores do Coletivo de Entidades Negras (CEN) na Bahia, que foi para cima e conseguiu no primeiro ano do Governo Wagner isso que é o Ouro Negro. Para quem recebia R$ 5 mil ou R$ 7 mil para fazer carnaval passou a receber R$ 15 mil, R$ 20 mil em média, por entidade, o que não dá, porque o carnaval é uma festa extremamente cara e o da Bahia, mais ainda. Quando Leonelli (Domingos Leonelli, atual secretário estadual de Turismo e dirigente do PSB-Bahia) era secretário municipal de Economia, Emprego e Renda, se montou a Fábrica do Carnaval, um projeto de extrema importância para a produção de fantasias e instrumentos de música. Mas e agora? Aí não se gera renda no gueto. Então, o PSB precisa estar sintonizado com os anseios das entidades afro que fazem o carnaval cultural e popular.
Tonho Matéria: E os blocos afro são blocos de fantasia. A gente faz mobilização dentro das comunidades com o pessoal da dança, da percussão, da costura das fantasias. Este ano, recebemos menos R$ 20 mil do Ouro Negro e eu queria entender o porquê. Se o bloco cumpriu seu papel no carnaval, prestou as contas dentro do prazo, está com tudo em dias ainda acaba penalizado?
PSB-Bahia: O Estado deveria, então, financiar o carnaval cultural?
Ari Sena: Mas não existe no Brasil, nem na Bahia, compreensão ou boa vontade política para estabelecer no orçamento público reservas para o financiamento do carnaval, como forma de garantir a cultura. Somos um país desmemoriado. Você chega na província de Trento, a segunda mais importante da Itália, e lá 22% do orçamento é destinado para a cultura.
Gerônimo Santana: Deveria haver uma secretaria…
Ari Sena: Se o Brasil investisse algo em torno de 10% do seu orçamento na cultura, iríamos fazer uma revolução monumental. Porque a cultura leva tudo junto: se o modelo de gestão da cultura satisfizer às pessoas, a educação vai estar em alta, vai melhorar a segurança pública, a saúde, a economia e tudo o mais. Mas isso não existe. Ainda prevalece a cultura do colonizador de apropriação indébita dos nossos recursos: daqui se rouba tudo, se leva tudo. Primeiro foi o pau-brasil, depois o ouro, o café, cacau, e hoje, o melhor elemento que se tem é a cultura, principalmente a afro. O cara chega ali, fotografa a Igreja com as baianas, com a capoeira e não paga nada. Estamos em todas as partes do mundo, mas não recebemos nenhum royalty pelo uso da nossa cultura e da nossa imagem.
Enoque: A verba federal para a cultura é de 1,3% do PIB. Há oito anos se briga para que seja de 1,5%, não são nem os 10% que Ari falou. E quando você entra nessa coisa do patrocínio das entidades do carnaval, tem que falar da Lei Rouanet, que há oito anos se briga também para que ao invés da empresa ter o poder de dizer para onde vai aquele recurso da isenção fiscal, que não é dela, o Estado aponte aonde ele vai ser aplicado. Isso não abriria mais espaço para o que vem acontecendo aí: o cara tem uma renúncia de R$ 1 milhão e dá para quem ele quiser. O Bonfim Light, por exemplo, recebeu R$ 900 mil no ano passado. Isso é que é apropriação da cultura popular.
Tonho Matéria: Essa apropriação da cultura também está no Dois de Julho, quando Cláudia Leitte faz o show representando a cultura baiana, a cultura negra. Quase todos os artistas que ganham patrocínio, se for ver direito, é com dinheiro público, pela Lei Rouanet. E isso não volta para as pessoas que mantém viva essa cultura. É isso que a gente faz com as comunidades. Eu tenho o Bloco da Capoeira, Nadinho tem o afoxé e a nossa ação é do povo para o povo. Nós mostramos o bloco afro como o trabalho de um ano inteiro. E quando a gente busca um patrocínio é para mostrar esse trabalho no Carnaval.
Enoque: Há 11 anos eu estava no A Tarde e disse a Tonho Matéria que ele não precisava de patrocínio de ninguém. Bastava que cada vez que cantassem uma música deles dissessem “essa música é de Tonho Matéria”, porque só nesse carnaval foram 13. Outras oito eram do Olodum e de Itamar Tropicália.
Ari Sena: Que morreu do jeito que morreu…
Gerônimo Santana: Não lembro quem me disse que só no ano passado recolheu de direitos autorais na Europa 120 mil euros por aquela música “Elegibô”.
Enoque: E eu venho alertando que está havendo uma corrida dos artistas e meios de comunicação rumo à Copa do Mundo de 2014 de se africanizar. Saulo Fernandes – nada tenho contra ele – é negão desde o semestre passado, montou o projeto Tambor com Magary Lord e já foi tocar no Ilê. Cláudia Leitte vem com um dvd chamado “A negra loira” e alguém ainda vai botar um cocá na cabeça e atravessar um pano da costa para representar a cultura afro-baiana na Copa.
Tonho Matéria: Mas tem uma música – “Que bloco é esse?” – que é culpada disso estar acontecendo: “Branco, se você soubesse o valor que o preto tem, tomava um banho de pixe pra ficar preto também” (risos).
PSB-Bahia: Tonho, você é conhecido no mundo todo pelo seu trabalho na chamada “axé music” e também como vocalista do Olodum. Porque você partiu para um projeto de carnaval popular?
Tonho Matéria: Na verdade, eu sempre fiz um trabalho com a capoeira, que não era midiático. As pessoas não davam importância à ação de bairro, ao trabalho de comunidade. Trabalho com capoeira há 35 anos, aprendendo e ensinando, porque o capoeirista quando aprende começa a ensinar. Com relação ao Olodum, ele é uma escola, uma universidade onde você se forma e vai atrás do seu caminho. E o Olodum tem uma diretoria. Eu tinha vontade de fazer meus trabalhos próprios, com pessoas que pensam parecido da forma que eu penso. Aí surgiu o Bloco da Capoeira –www.capoeiranatv.com.br -, que fica no Pau Miúdo. E os capoeiristas sempre estiveram presentes nos blocos, mas puxando corda. Nunca tiveram uma ação de brincadeira, de curtir a capoeira. Por isso resolvi fazer esse bloco, que existe desde 2008. Isso está incomodando tanto que, nesse carnaval, já estão querendo tirar o bloco, que só faz o circuito Campo Grande.
PSB-Bahia: Em que dia e horário sai o bloco?
Tonho Matéria: Saímos às 20 horas, na quinta-feira, mas nosso bloco ainda depende de um trio subsidiado pela Saltur (Empresa Municipal de Turismo). E a Saltur nem sempre mando o carro no horário que a gente precisa. Às vezes só chega duas, três horas depois. Então, se há um atraso, não é culpa da entidade.
PSB-Bahia: Ari e Nadinho, vocês também dependem de trio da Saltur?
Ari Sena: Todos dependemos. O custo médio de um trio elétrico por dia é de R$ 25 mil a R$ 30 mil (nessa conta entra óleo, técnico de som, luz, etc).
PSB-Bahia: Tonho, como as pessoas podem sair no Bloco da Capoeira?
Tonho Matéria: Faço um recorte dos grupos de capoeira envolvidos porque se for convocar toda a capoeira, são mais de 500 mil capoeiristas na cidade. Isso às vezes causa uma ciumeira, mas vamos resistindo. Mas pode sair amante da capoeira, pode sair turista. A camisa custa R$ 10, R$ 20, eu coloco lá no e-mail: faça sua doação para o Bloco da Capoeira. Mas antes dele teve o Gunga, que só saiu até 1985 em parceria com os mestres Almeida, Boa Gente, Boa Morte.
Gerônimo Santana: Gunga é o jogo de capoeira da nação Angola.
PSB-Bahia: Vem dessa resistência cultural, Matéria, sua opção de se filiar ao PSB?
Tonho Matéria: Estou há quase dois anos no PSB, mas o partido precisa estar mais junto. A construção é conjunta. Como, por exemplo, na Revolta dos Malês, que foi uma conjuração de diversas etnias. Foi uma manifestação africanista, não foi só uma etnia.
Ari Sena: O que Tonho Matéria quer dizer é que o partido é uma via, um fio condutor, um instrumento político para essas ações de transformação da sociedade e que a gente se filia a esse partido, enquanto cidadãos negros, na busca de um projeto que nos contemple efetivamente, tanto na questão cultural, quanto como cidadãos que precisam ter seus direitos respeitados. Eu, por exemplo, estou há oito anos no PSB e entendo que ele tem que ser capaz de levar as lutas da sociedade e, em se tratando da Bahia, as lutas dessas comunidades negras e desses expoentes da cultura negra.
PSB-Bahia: E você, Gerônimo, porque você se filiou ao PSB?
Gerônimo Santana: Sou muito amigo de Ari da Mata, que já havia me chamado para o PV, partido com o qual simpatizo muito. Mas aconteceram algumas coisas que me fizeram sair do PV e acompanhar a ida de Ari para o PSB. E a integridade, a coragem e a honestidade de Lídice da Mata fazem dela a minha referência e motivo de estar nesse partido. Tem outra coisa: me sinto livre para pensar, dizer o que penso e até criticar o partido, se for necessário. Me sinto livre. É um partido que não me impõe obrigações ferrenhas. E já faço a minha parte porque eu sou um socialista. Entre os partidos que têm aí, considero o PSB um partido moderador: ele não é radical, nem é de centro. É de esquerda. E é por esse equilíbrio que incomoda tanto, a ponto de já dizerem na imprensa que o governador de Pernambuco, Eduardo Campos, é a reencarnação de ACM, é um novo coronel do Nordeste. Eu não vejo isso. Ele se destaca pelo trabalho social que está fazendo e aí começa a ganhar os apelidos. Coronel era eu como o senador corno da novela (a minissérie da rede Globo Pátria Retumbante). Se existe alguma semelhança com a realidade, me perdoe, porque eu não sei (risos).
PSB-Bahia: Nadinho, como é sua história com o carnaval?
Nadinho do Congo: Comecei com os Desajustados da Liberdade, que era um bloco de samba, de percussão, em que os foliões se vestiam de pescador. Depois fui para o Ilê Aiyê com um companheiro que não está mais entre nós, Apolônio, e o Carneiro do Reco, que era mestre de bateria. Hoje a gente vê um bocado de mestre, mas maestro verdadeiro era aquele que apitava e coordenava. Sai no segundo ou terceiro ano, pouco antes do Ilê ganhar fama com o Edno, grande engenheiro de som. Dentro do próprio Ilê criamos um bloco chamado Fantásticos, apoiado por Apolônio e, quando ele acabou, me afastei do Ilê e criei o Afoxé Filhos do Congo.
PSB-Bahia: Os Filhos do Congo trazem música de santo para a Avenida?
Nadinho do Congo: Hoje a gente traz uma abertura apenas com as músicas mais cantadas, que estão na boca do povo. Agora, música de profundidade a gente tem o respeito de não trazer, até porque o criador do Filhos do Congo lá no final do século XIX, o Velho Rodrigo, era de Omolú e tinha grande respeito por isso e foi criado no Engenho Velho de Brotas. Quando ele faleceu, o filho veio a tomar posse do afoxé em 1947 e foi até 1949, quando houve uma dissidência com os Filhos de Ghandy. Aí parou um tempo porque ele faleceu. E ressurgiu em 1979 comigo. Aí que eu percebi que não tinha nenhuma associação ou federação para registrá-lo. Só muito depois é que surge a Federação dos Clubes Carnavalescos, que começa a registrar os blocos e artistas.
PSB-Bahia: Onde está localizada a sede do Filhos do Congo e com quantos integrantes ele sai?
Nadinho do Congo: Está entre os bairros de Cajazeiras e Boca da Mata e nossa intenção é sair com 600 a 700 pessoas da comunidade, da mesma forma como o Velho Rodrigo zelava pelas pessoas como babalorixá e depois seu filho, Salvador, que era de Oxóssi. E depois que ele morreu, a família não quis mais tomar posse. Saímos no domingo e na terça, às 18 horas, no Circuito Osmar, que vai até o Campo Grande.
PSB-Bahia: O bloco tem ligação com algum terreiro?
Nadinho do Congo: Tem, sim, com o Ilê Axé Opá Inã, da Mãe Dulce, que é madrinha do afoxé. Fica na Boca do Rio, próximo ao Parque de Pituaçu e lá temos desenvolvido algumas ações. Eu sou o Ogã mais novo da Casa e tenho tido esse caminho de formação, de manter viva essa cultura. É uma manifestação cultural de grande resistência, que protegeu a capoeira e o candomblé, possui registros com mais de 160 anos. Não é à toa que lutamos para que ele seja reconhecido como patrimônio imaterial estadual e nacional, porque temos mais de 150 afoxés espalhados pelo Brasil. Quando não se podia bater o candomblé, porque a polícia ia lá e acabava, o afoxé saia visitando a casa dos amigos dentro do carnaval, se cantava em iorubá, em jeje e desaguava aqui na Baixa dos Sapateiros.
PSB-Bahia: O associado paga para desfilar?
Nadinho do Congo: Na visão da nova secretaria, o associado deve pagar porque existe transporte, corpo de dança, músicos e cantores, que a gente ensina para dar continuidade. E esse apoio que a gente recebe gera emprego e renda, porque a gente distribui.
PSB-Bahia: E porque você decidiu se filiar ao PSB?
Nadinho do Congo: Eu estive no ano passado em Brasília com Vovô e João Jorge pela ocasião do Ano Internacional dos Afrodescendentes e a senadora me chamou para o partido. Quero que o Ano Internacional dos negros continue vivo dentro da proposta desse partido. É essa importância que ela, Lídice, também quer dar à negritude dentro do partido. Por isso essa entrevista é importante, para mostrar que não estamos de brincadeira. Queremos expor isso para as escolas, para as universidades, para a sociedade. E tenho a intenção de, após o carnaval, escrever um livro sobre os ícones da cultura afro-brasileira, até porque existe muito preconceito nas escolas com relação ao afoxé. Muitas pessoas pensam que é música de candomblé e não é. Gerônimo é um dos artistas que mais têm lutado para mostrar isso.
Gerônimo Santana: Se o PSB começar a fazer política pela cultura terá um projeto vencedor.
PSB-Bahia: Ari, só não falamos do Alabê.
Ari Sena: A história do Alabê é engraçada. Nasce em 1981, na Vasco da Gama, em frente à Rua da Lama, com Alírio Tubaê, que todos aqui conhecem, um dos primeiros compositores do Olodum, que, inclusive, foi campeão do primeiro festival do Olodum.
Tonho Matéria começa a cantar: Toda negrada, não vai sobrar nenhum! Cantando reggae na sexta-feira de Olodum!
Tonho Matéria e Ari Sena: Sexta-feira de noite a negrada se agitou por aí! Cantando assim, meu povo, cantando assim!
Gerônimo, Matéria, Ari e Nadinho juntos: Olodum! Ô, Olodum! Olodum! Ô, Olodum! Olodum, Olodum, Olodum…
Ari Sena: E o Alabê desfila pela primeira vez em 1982. Se muda em 1985 para o Curuzú, onde somos vizinhos do Ilê Ayê.
PSB-Bahia: Vocês são ligados a algum terreiro como o Ilê e o Filhos do Congo?
Ari Sena: Não diretamente, mas todos os nossos integrantes são iniciados no candomblé. E oferecemos cursos para a comunidade como fazem os Filhos do Congo. Temos umas 80 pessoas diretamente ligadas às atividades do Alabê. Começamos afro, mas fizemos uma opção pelo afro-pop por uma questão de sobrevivência, porque é muito caro manter uma percussão com, por exemplo, 150 homens. Hoje, saímos sexta e domingo, às 20 horas, no circuito Osmar (Campo Grande), com banda em cima do trio e uma média de 500 associados. Este ano, pela primeira vez, vamos vender as fantasias. A individual está R$ 60 e casadinha, R$ 100.

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